segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Crútero






Festival De Apartamento - Campinas 2012.
Crútero.
Concepção e Performer - Juliana Bom-Tempo.
Produção executiva, Edição de Imagens e Câmera - Cristiano Barbosa.
Auxilio Técnico - Luciana Ramin.

O que pode o risco da não efetivação?

sábado, 28 de janeiro de 2012

Concreto



















Concreto[1]


Juliana Bom-Tempo


Sobre as notas.[2]


Vídeo: concreto


Imagem borrada insinua o corpo ereto. Corpo busca articulações em tensões dinâmicas para se manter sustentado. O próprio corpo (in)sustenta a ação do corpo. Saltos e sandálias rumam ao abismo. Movimentos silenciosos. Corpo cotidiano retira os excessos de corpos concretos. Desarticulares movimentos. Espasmos. Corpo construção sustenta e cai. Desmorona escombros em tensões articulares. A construção de concreto inacabado desarticula tijolos e pó, pedaços ásperos de pequenas pedras soltas constroem escombros de um espaço extensivo que se intensifica no limite da imagem. A imagem da câmera pára, delimita, aproxima, afasta. Planos[3] abertos e focados desmoronam e sustentam misturas de corpos, de obras e de imagens em formação de Platôs. Imagens em desconstrução. Imagens e movimentos giram, param, engendram tempos. A imagem se mistura ao concreto e ao corpo. Instantes configuram imagem - pedaços corpóreos –concreto. O silêncio invade o som da construção-demolição. Tilintadas de martelo, sensação ferro, sons e silêncio articulam imagens em (des)foco. Espacialidades intensivas nas misturas e fissuras que brotam entre imagens, fragmentos corpóreos e concreto.


Qual é a potencia do risco, do corpo imagem em risco?








A questão que dispara a performance, o vídeo e esse texto tem como mote o que pode o risco. Qual é a potencia do risco de não se efetivar, de não se sustentar? O que pode o intermezzo da efetivação e da decomposição como processos de criação?


Na procura dessas fissuras, o tempo se intensifica nas tensões corpóreas de imagens paradas e em circulação na desconstrução. Ovos de tempo[4] agenciam marcas corpóreas que podem se ativar a qualquer momento. Essas marcas são os estados ainda não atuais que se produzem nos corpos (corpos subjetivos e orgânicos, corpos concreto, corpos imagens) compondo relações que buscam a força da composição[5] através do vivido, potencializam os acontecimentos do real enquanto virtual e intensificam as possibilidades de atualização ao entrarem em conexões a partir de negociações[6] corpóreas, nos interstícios de corpos, construção e imagens. Ao mesmo tempo, se encontra presentificado o risco da decomposição, da não efetivação, da morte e do aborto de obras em criação: obras corpo, obras prédio, obras imagens.


O vídeo[7] procuram-se e se projetam enquanto configuração desterritorializada e nômade de linguagem buscam agenciar escombros e possibilitar a emergência de espaços estéticos ao disparar rupturas nos signos videográficos narrativos, com a possibilidade de produzir afecções[8] potentes que agenciem novos processos e, ao mesmo tempo, corre-se no risco de não vingar, não se efetivar. Tempo se desarticula da união espaço – tempo enquanto dimensão óbvia do extensivo cronológico. Tempos em imagens escorregam esquemas que representam o real. Há desvios de signos cotidianos de corpos, de prédio em obras, de imagens.


O que se quer dizer? A questão maquinada[9] pelas possíveis imagens-linguagens do vídeo procura perfurar sentidos engessados em construções prontas e acabadas de estruturas lingüísticas significantes de corpos-imagens-concreto em obras. Os movimentos vão se prolongar imprimindo nos corpos (orgânico, imagem, concreto) o infinito[10], pois uma posição corporal sempre indica outras posições e outros gestos em uma composição contínua propiciada pelo ritmo desarticular. Assim, a relação tempo e espaço dos fragmentos corpóreos, do concreto, dos movimentos e das imagens sofrem abalos. O próprio corpo se prolonga e transporta seus fragmentos para o infinito, a procura do risco. O corpo que movimenta abre fendas, buracos, brechas, vinculadas ao lado de fora, criando fragmentos intensivos entre os “hífens” que criavam antes uma correspondência direta no corpo – espaço – tempo que, no vídeo, tende a outros tempos[11].


Esses tempos se presentificam no atual dos corpos e, ainda, mantém disponíveis os tempos da memória na sua totalidade, como virtualidades do real, criando oscilações em riscos de atualizar quedas, desmoronamentos, lembranças do insustentável no corpo.


Os riscos de estar em processo desarticular agenciam tempos e aprendizagens[12] que desviam signos. Riscos do tombo, da queda, dos fragmentos em corpos trêmulos, em imagens trêmulas. Encontros que potencializam meu corpo a proliferar corpos nos quase tombos, nos quase prédios, nas quase imagens nítidas ou borradas, nas cores ocres. Ocres que penetram a pele e os settings dos planos-platôs abertos e sem focos. Corpos em queda penetrarem nuvens de imagens amarela marrom, cor da pele, cor da imagem-pele, cor de concreto.










[1] Texto escrito a partir do vídeo “concreto” produzido na relação entre performance, corpo, (des)construção e imagens em novembro de 2011, por Juliana Bom-Tempo e Cristiano Barbosa, Campinas – SP. Esse vídeo foi editado na perspectiva de funcionar como vídeo instalação, em duas TVs de plasma com 42” em tempos diferentes de projeção, com equipamentos sonoros de forma a compor sonoridades a partir dos encontros da repetição e diferenção em um vídeo que se transmuta em dois vídeos tempos.



[2] Para isso, as notas que seguem podem ser lidas independentes do texto e o texto independente das notas, ou ainda, podem ser lidas junto com o texto.



[3] Os planos das imagens dos vídeos funcionam como Platôs enquanto áreas em que não existe discernimento entre corpo, objeto, imagens e vídeo em um movimento de transmissão mútua de atributos e traços. Consciência e corpo são atravessados por “tessituras” comuns no encontro entre construção e imagens videográficas. (Deleuze & Guattari, 1995).



[4] Os vídeos agenciam nascedouros de tempos entre sons, silêncios e espasmos. Ovos do tempo nas palavras de Suely Rolnik (1993), ao se deparar diante da possibilidade de recriar o tempo do qual se propõe a falar ao buscar um memorial de seu trajeto de vida. Suely coloca a impossibilidade de reproduzir linearmente sua trajetória, mas, antes, se remete ao que chamou de “marcas” para criar e inaugurar um novo percurso na atualização de sua fala. Marcas que a violentam e a obrigam ao empreendimento estético de um novo caminho. Assim, o corpo em queda agencia tempos em imagens sonoras e silenciosas. Tempos que produzem novos caminhos pelas aberturas de vídeos sem começo e sem fim, aberto a entradas por qualquer parte, vídeos que se fazem por rizomas em conexões e desconexões imprevistas.



[5] Conexões e desconexões que se encontram com relações de composição e decomposição. Tais relações se articulam ao pensamento de Deleuze e Espinosa (2002), encontros podem produzir composições de corpos que se afetam e potencializam a vida, encontros potentes que abrem o apetite, bons encontros. Além disso, esses encontros podem produzir relações de decomposição, encontros que tiram a potencia da vida. Encontros pressupõem riscos de composição e decomposição, riscos de vida e morte, de potência e destruição.



[6] Esses encontros são agenciados por negociações corpóreas que acontecem na relação das microtensões que constituem o corpo orgânico, as imagens e o prédio em obras. Negociações de espaço extensivo, câmera e corpo em movimentos desarticulares. O espaço vídeo-corpo-construção é pensado junto à geógrafa Doreen Massey (2009) ao discutir o espaço enquanto relações construídas em políticas geográficas que se efetivam pelas necessidades de negociações. Espaço como produto das relações, como multiplicidade e enquanto diferença. Nos procedimentos empreendidos pelos encontros corpos, imagens e construção, as conexões desarticulares passam por negociações e empreendem a construção de espaços intensivos em microtensões dinâmicas.



[7] O espaço vídeo se desarticula em signos pré estabelecidos e problematiza os planos seqüência da linguagem fílmica. Assim, Christine Mello (2008) pensa as novas mídias e as possibilidades de construções de espaços a-significantes e de afecções disparadas pela vídeo-arte.



[8] As afecções de corpos orgânicos, imagens e construção são pensadas como proposto por Espinosa, affectio que se refere ao corpo afetado, sendo necessário, portanto, a presença de corpos afetantes. Afecções-imagens, afecções que procedem dos encontros, aumentando ou diminuindo a potencia de vida, a potência de agir, discussão presente no livro Espinosa: filosofia prática de Gilles Deleuze (2002). As afecções acontecem nos encontros, nas articulações e desarticulações maquínicas de corpos que funcionam em composição e decomposição.



[9] O conceito “maquínico” foi criado por Félix Guattari (1992) e está ligado ao funcionamento que se dá através de comunicações expostas e sutis. Um jogo de dentro e fora dos corpos. Contexto-sensitivo em que a mensagem é emitida. Receptores corpóreos conectados em mensagens emitidas pelas máquinas. As máquinas sociais funcionam como Equipamentos Coletivos operando no núcleo das subjetividades, consciente e inconscientemente. Assim, há um processo de concorrência entre os componentes heterogêneos para a produção de subjetividades e de corporeidades. São os componentes vinculados às instituições tais como família, religião, arte, educação, saúde; os componentes fabricados pelas mídias e os componentes sutis de informatizações a-significantes, que nos atravessam em comunicações inconscientes da articulação entre componentes. No caso em questão (des)articulações de corpos, imagens e concreto em movimento.



[10] Os movimentos dos corpos subjetivos, imagéticos e de concreto constituem a impossibilidade do estático, o homem em pé já é movimento mesmo no repouso, pois microscopicamente não há repouso. José Gil no livro Movimento Total (2005), fala do bailarino como aquele que retoma seu corpo no momento em que perde o equilíbrio e corre riscos frente ao vazio, corpo construído por atravessamentos de forças em microtensões e movimentos. Configuração de “espaço-corpo efêmero, por cima do abismo” (p.13). Intervalos de esforços do corpo que acontecem no ponto zero do movimento desarticulado, movimento suspenso, silêncios e sons dos tempos.



[11] Os tempos heterogêneos acontecem na duração, em variações contínuas, construindo realidades moventes, tempo que acontece por afectos, tempo virtualizado em atualizações pontuais e sempre vulneráveis as lembranças puras de um tempo fora da consciência. Tempos acontecem na distração de um empreendimento estético. Tempos articulados ao pensamento de Henri Bergson, Memória e Vida: textos escolhidos, (2011). Tempos potencializados em memórias que atualizam e criam realidades a cada ponto, dobras de tempos presentes em marcas do vivido. Tempos de aprendizagens inventivas da vida.



[12] Aprendizagens intimamente ligadas ao tempo enquanto procedimento de relembrar, tendo a memória como meio, e, paradoxalmente, está em um movimento de busca direcionado para o futuro. Aprender é encontrar signos e emitir outros signos. Assim, os signos possuem ao mesmo tempo, unidade e pluralidade voltada a movimentos de busca. Cada signo faz parte de várias dimensões do tempo em busca da verdade. Assim, a busca da verdade está ligada à busca do tempo perdido, em buscas de aprendizagens. A verdade, portanto, possui uma relação íntima com o tempo. Só se procura o tempo perdido e a própria verdade quando se é impelido a fazê-lo. Isso acontece quando se é violentado a procurar a verdade, se dá por necessidade e não apenas por boa vontade. Esta violência vivida é a garantia de uma busca que assegura a autenticidade do aprendiz. É através de encontros casuais com signos que essa pressão coercitiva acontece e exerce violência. Só é possível querer a verdade, coagido por uma necessidade gerada pelo encontro em relação a determinado signo. Quer-se e necessita-se encontrar o sentido do signo. Esta busca é sempre temporal e a verdade é um acontecimento engendrado em um tempo múltiplo e plural. Tempo perdido. Aprendizagens como acontecimentos também pensadas por Gilles Deleuze em Proust e os signos (2010). Esses tempos se efetivam em buscas, empreendendo na memória o procedimento para se encontrar, se relembrar. Riscos da não efetivação de aprendizagens, procedimentos frágeis que sofrem recuos, regridem, sofrem desvios e atrasos. Risco da não aprendizagem, da violência e necessidade caírem no vazio dos signos fixos, do corpo caído, da construção desmoronada, das imagens em borras de cores e sons.


REFERÊNCIAS:


Bergson, H. (2011). Memória e Vida: textos escolhidos por Gilles Deleuze. Trad. Bento Prado Neto. 2ª Ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes.


Deleuze, G. (1987). Proust e os signos. Trad. Antonio Carlos Piquet e Roberto Machado. Rio de Janeiro: Forense-Universitária.


Deleuze, G. (2002). Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta.


Deleuze, G.; Guattari, F. (1995). Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia. Volume I. Rio de Janeiro: 34.


Guattari, F. (1992). Caosmose: um novo paradigma estético. Trad. Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão. São Paulo: 34.


Gil, J. (2005). Movimento Total. São Paulo: Iluminuras.


Massey, D. B. (2009). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Trad. Hilda Pareto Maciel e Rogério Haesbaert. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.


Mello, C. (2008). Extremidades do Vídeo. São Paulo: Editora Senac São Paulo.


Rolnik, S. (1993). Pensamento, corpo e devir: uma perspectiva ético/estético/política no trabalho acadêmico. In: Cadernos de Subjetividade. Núcleos de Estudos e Pesquisa da Subjetividade do Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Clínica da PUC/SP — v. 1, n. 2, São Paulo, p. 241–51.

Incorporações Urbanas


Imagens buscam a captação dos entremeios, das velocidades, dos fluxos urbanos. Falo do meu corpo, que é qualquer corpo urbano, qualquer dos corpos em meu corpo. Busco a apreensão dos corpo\corpos com tensões incorporativas. Incorporações Urbanas. Fluxos, velocidades, micro-tensões na dinâmica da cidade. A mega-maquina cidade funciona como uma máquina se autoproduzindo. Reproduzindo permanentemente seus componentes articulares compondo um sistema. Busca de componentes no exterior dela mesma. Componentes corpos. Máquina autoprodutora e exterior a ela mesma. Ambivalência simultânea. Simultânea em caráter autopoiético interfaceando seus desenvolvimentos alopoiéticos. Processo em uma política exterior, configurando relações de alteridade. Corpo-corpos em processo complexo. Configurações em movimento, em corpos dinâmicos, em fluxos contínuos.

Este trabalho tem como questão investigar as cartografias corpóreas presentes em espaços de convergência de serviços, comércio, lazer; configurando espaços urbanos: o primeiro sofrendo um processo de ocupação recente e o segundo espaço de ocupação consolidada em uma aparente desaceleração econômica. O objetivo desta pesquisa é entender a corporeidade enquanto um processo vivo de configuração, que se dá no “entre” do corpo físico e do contexto ambiental, em um processo de incorporação dos atravessamentos urbanos da atual sociedade de controle, regida pelos mecanismos do Capitalismo Mundial Integrado na produção de corpos atravessados por agenciamentos capitalísticos. Esta investigação se deu através de gravações de imagens nos dois espaços urbanos em horários críticos de aceleração dos fluxos de trânsito, de comercialização e de transeuntes nas ruas. As cidades foram Rio Verde – Goiás e Uberlândia – Minas Gerais. Os conceitos para pensar estes processos de incorporação da urbanização foram: sociedade de controle, as três ecologias, cultura de massa, corporeidade, incorporação, processos maquínicos, corpomídia, consciência do corpo, corpo-consciência. Os teóricos que contribuíram nesta produção foram Deleuze, Guattari, Katz, Greiner, Foucault, Rolnik e Gil. Assim, o trabalho culminou na produção de um vídeo editado na perspectiva de provocar no espectador deslocamentos por meio das imagens-fabulações dos corpos passantes nos espaços-tempo urbanos atravessados pelo trânsito, mídias comerciais, velocidades, privatizações das relações; produção de subjetividades capitalísticas, corpos territorializados pela mega-máquina cidade.